Curitiba, 12 de agosto de 2022.
[Vernazza, 09 de outubro de 2018.]
O ano era 2018.
A tarde, que próximo dos trópicos seria noite, chegava ao fim, na cidadezinha de Vernazza, a 7a do dia (acordamos em San Gimignano e tomamos mais um gelato da Dondoli - o que valeria um relato/carta aberta/declaração de amor exclusivo; seguimos pra Pisa, visitar, por fora a famosa torre - sei lá, num bateu de subir; almoçamos em Lucca, uma pizza especial com massa de grão de bico, acompanhada de meia garrafa de Lucchesi branco, seguida da inesquecível torta de castanhas [portuguesas] recheada com ricota; dirigimos até La Spezia, onde deixamos o carro; apenas com uma malinha de ataque, pegamos o trem para Riomaggiore e fizemos o check-in em nosso BNB; seguimos para a primeira - ou última - das Cinque Terre, Monterosso al Mare, onde me surpreendi, novamente, com a minha sempre pouco valorizada atração por praias - preteridas às montanhas; para então, entardecer em Vernazza - e a quantidade de eventos que cabem em um dia de viagem sempre me instigam - isso que, boêmios, não somos exatamente madrugadores…). Encantados com as pedras avançando ao mar, elegemos o vilarejo como o local perfeito para encerrar os trabalhos daquela terça-feira. Fomos até uma vendinha. Compramos a garrafa de vinho que havia disponível (um Cinque Terre Mureti Rosso) - e que estava a preços módicos, considerando o orçamento mais justo que os meus shorts jeans estavam ficando após quase 20 dias de Itália. Sempre de tênis (ainda entenderei como grande parte dos brasileiros viaja de havaianas. Ou nunca.), seguimos eleger o hot spot para mais um pôr do sol - das tradições nossas, onde quer que estejamos (talvez uma obsessão curitiboca, diante dos contáveis nos dedos de uma mão, em um ano típico - drama queen? Sim!). Andamos por entre as pedras, perdigotos de água salgada refrescando nossas canelas, até encontrar o lugar perfeito - vista limpa e privilegiada, pouca gente por perto, rochas cuidadosamente esculpidas para melhor acomodar nossos traseiros e mochilas. Sentamos. Alcançamos o último abridor de vinho adquirido para nossa involuntária coleção - mais um, de dois tempos, para o acaso daquele que deveria ficar nas malas nunca ter saído da gaveta da cozinha. Brindamos com soquinhos, aliança tilintando no vidro da garrafa escura. Nos colocamos a beber, jogar conversa fora e acompanhar a despedida do sol, após mais um dia de férias tão planejadas e desejadas.
Uma gargalhada abafada nos tira do torpor. Pouco atrás de nós, seguindo destino próximo, um casal sexagenário nos surpreende, nos supera: além da garrafa de vinho, trazem nas mãos, uma pizza. Equilibram-se, bailando involuntários entre as pedras, tentando avançar um pouco além. Riem de si mesmos, atrapalhados pelas mãos ocupadas. Decidem voltar um pouco. Escolhem seu espaço, acomodam-se. Entre sorrisos, um discreto tocar de lábios. Abrem o vinho, vibram. Pegam fatias da pizza com as mãos, puxando e enrolando, com a ponta dos dedos, o queijo que quis ficar. A experiência exposta em seus rostos é iluminada pelo avermelhar do céu no poente. E o espetáculo do sol é ofuscado pelo brilho de seus olhares matreiros.
Volto-me para o Lu e o percebo também fisgado por esse outro espetáculo da natureza.
- Que a gente siga assim - digo, do auge da inocência da suposta sabedoria dos 30.
- Mas que a gente não leve o dobro da nossa idade pra ser tão brilhantes. Pizza? Os caras são uns gênios.
O sol toca o horizonte e, como no Arpoador, aplaudimos, os dois.
Das coisas que mais adoro: escrever diários e relatos de viagem. Demorei muito tempo (olha a trintona achando que viveu muito, DE NOVO) para me descobrir uma fã de estrada. Mas, quando isso aconteceu, quando acontecemos, Lu e eu, não houve volta atrás. Cada oportunidade de saracoteio era muito bem aproveitada - as férias, planejadas nos mais pequenos detalhes e vividas com intensidade. Julgo, ainda hoje, ostentar olheiras profundas, decorrentes desse bem viver (não culpemos, jamais, o pitoco).
Aí 2020, [bla-bla-bla, whiskas sachê], ficamos por casa mais do que estávamos acostumados (tenho até uma teoria que, desculpa, a pandemia pode ter sido culpa nossa, pois o plano-ótimo de viagens, registrado em ata de pub, assinada e lavrada - nem sei o que é isso, mas achei que ficaria bacana dizer - não passa de 2019… Outra conversa…). De todo, não foi ruim. E, quando o coronga deu leve trégua, até rolou idas pro mato, de barraca e carro (saudoso kwid guerreiro, outsider de verdade). Mas viagens, como estávamos acostumados a fazer, a organizar… Bem… Ficaram em suspenso - tal qual meu desejo de escrever sobre elas, editar fotos, organizar vídeos, montar álbuns, enfeitar parede - saudosa (de burro) que estava.
Dias melhores vieram (pelo menos, para nós. Uns tremendos privilegiados!). As coisas vão voltando, não ao que eram, mas assentando. E, de repente, nos encorajamos. Com mais mudanças do que jamais imaginado (máscara será o de menos), sábado partimos para nova trip. O destino? Jericoacoara. Planos? Curtir. Agora, a três. Mal posso esperar para ser surpreendida por essa nova versão.
Nesse hiato de mais de 2 anos, encontrei outras formas de viajar, entre as quatro paredes da Tasca…
pelos livros, visitei diferentes países, culturas, costumes, tempos. Destaque para o top 5 do período (lembrando que não tem nada mais dinâmico do que um ranking. Se me perguntar assim que eu terminar de escrever, já mudei de ideia, tirei um, coloquei outro. Ou todos.):
a Paris, sob os olhos de sua personagem mais icônica, Sylvia Beach;
a Itália, da segunda guerra, sob a ótica familiar de Ginzburg;
a própria Jeri, de Lorena (que não é prima; mas foi corresponsável por esse desejo de viagem);
a América Latina - não um lugar, mas vários, não um tempo, mas entrelaçados - de Allende;
os amores, de toda parte - mas pra queimar, depois - da Lucy Borges.
(precisam ser só 5?!)
pelos filmes. Ando numa irremediável ressaca de séries, depois de longas sessões de mamaratona. Resolvi, então, me adentrar no universo cinematográfico - ou, em parte especial dele. Fiz uma lista de clássicos que aquece(ra)m a alma, acalma(ra)m o coração, para ver ou rever (mesmo que pela enésima vez). Mais 5, talvez os queridinhos recentes… (
Mom brainaqui!):‘all that jazz’ de Chicago (sim, só vi outro dia. Pode?!);
a cozinha dinamarquesa, só que Toscana (ou vice-versa);
a NYC de Julie e a Paris de Julia (que voltei, pra me reencantar, pós série);
mais Paris, só que em sinfonia;
as viagens etílicas dos drinks da meia noite de bruxonas em uma ilha da Nova Inglaterra.
nesta rede. As newsletters ganharam meu coração faz tempo e tenho me deliciado com algumas, em especial:
relatos de viagem, dicas culturais de SP e muito bem viver com a NAZA (a última quase me fez comprar passagens pra Copenhague);
os postcards gringos da Yolanda e os diários do Vicente Frare;
os devaneios cirúrgicos, voos aos mais distantes destinos, da Bárbara, da Carol, da Mari e da Sarah;
as viagens pra dentro da Gabi, da Bruna, da Luísa (inclusive tema dessa lindeza em forma de livro) e, novíssima, da Pri;
por Curitiba, em seus lugares, notícias e histórias, com:
Ainda tem certa viagem na cozinha. Vez ou outra, nas memórias (nossas, de nossos pais, avós, bisavós). Todo dia, nas conversas (ainda bem)… Mas aí já é papo pra outra(s) carta(s) (e bora pautar essa edição, que já deve ter rendido mais três ou quatro)…
Despeço-me, apressada. Preciso correr fechar a mala e descobrir se ainda sei me restringir - ou se está na hora de aprender tudo de novo (o perigo de viajar a dois, de carro, mora em - “olha um unicórnio na sala!” - “leva, vai que precisa”. Já falei que o kwid era guerreiro?! - eita, e agora que somos três? MEDO!).
Com carinho (e pitadas daquela ansiedade boa pré-estrada),
Mari P. Bragança
Obs.: volto logo pra contar da trip . Mas, se tiver alguma dica especial de Jeri, me escreve?!
mari, muito obrigada pela menção <3 eu amo a sua escrita, e essa edição deu muita vontade de viajar :') parabéns por aqui também, aproveita muito o novo ciclo! e que venham mais viagens, geográficas, internas, cinematográficas, literárias e inesquecíveis. 🌻
Me senti imersa na sua viagem com esse texto <3